Sem dúvidas, nos últimos anos vivemos um novo momento como sociedade, são novas concepções de família, de escolhas de vida e de futuro. As realizações pessoais também já não são mais as mesmas do passado.
Enquanto para uma geração, a maior realização era ter um emprego para a vida toda, a geração atual tem outra ideia sobre realização profissional e assim em todas as áreas vivemos em uma constante metamorfose.
Isso é notado também nas relações interpessoais, onde cada vez mais pessoas transferem para um “pet” a sua atenção e afeto. Mas o que os especialistas têm a dizer sobre isso? Quais as vantagens e desvantagens? Como é a vida de quem escolhe como principal companhia um animal de estimação? Porque o número de pessoas que fazem tal escolha vem crescendo nos últimos tempos?
Vamos descobrir mais sobre este assunto. Está comprovado!
Pesquisa realizada pelo IBOPE em 2013 revelou que mais de 80% dos brasileiros tem um animal de estimação em casa, outras pesquisas revelaram que as pessoas se preocupam mais com os pets do que com seus semelhantes.
Os pesquisadores Arnold Arluke e Jack Levin, sociólogos da Universidade de Northeasten constataram a partir de uma série de estudos da relação fraterna entre humanos e animais o seguinte: “as pessoas ficam mais chateadas com as notícias de abuso de animais do que com ataques dirigidos para os seres humanos”.
Após realizar uma pesquisa em uma universidade onde mostravam as fotos de quatro vítimas, sendo elas um homem adulto, um bebê humano, um cachorro adulto e um filhote, é percebido que o bebê humano suscitou mais reações de dó, seguido do filhote de cachorro.
Eles concluem então que a importância emocional varia: quanto mais indefesos e desprotegidos, mais dó sentimos.
Psicólogos da Universidade da Geórgia também realizaram um experimento onde perguntavam aos jovens quem salvariam em uma situação hipotética, um cão ou um humano.
A resposta da maioria é que se fosse seu cachorro e um ser humano desconhecido, eles salvariam o cachorro!
O que alguns especialistas tem a dizer sobre o assunto?
Pesquisas também apontam que pessoas nascidas na década entre 80 e 90 (também chamados de millennials), responsáveis por diversas novas tendências e quebras de paradigmas, também iniciaram a tendência ao escolher cães e gatos ao invés de bebês.
Mas não só os bebês são “trocados” por animais de estimação, o próprio conceito de família mudou muito em relação à 50 anos atrás, quando pessoas de 30 anos normalmente já eram casadas e tinham seus filhos hoje essas pessoas tem apenas 50% de probabilidade de se casar.
Um estudo do ano de 2015 já havia revelado que os lares brasileiros tinham mais animais de estimação do que crianças. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apurou na época que o número de cães era de 52 milhões enquanto o de crianças era de 42 milhões.
Segundo o Psiquiatra Içami Tiba, a preferência por animais de estimação se deve ao fato de que ele dá menos trabalho, não reage, não questiona, ele se refere a isso como sendo “o reino da tirania da vontade. É mais do que o egoísmo: é um imediatismo. Desde crianças somos centrados no próprio umbigo, principalmente de uns 30 anos para cá.”
A respeito de pessoas que preferem animais à filhos ele comenta ainda: “Não querer ter filhos demonstra uma fragilidade emocional grande, porque faz parte da maturidade e do ciclo biológico você sobreviver e perpetuar. […] No filho a gente se vê, no bichinho não.”
Já a psicoterapeuta Marilene Krom considera um bom início o cuidado e o carinho com animais, mas diz também que a relação entre pais e filhos (humanos) é que se tornará uma das riquezas humanas mais significativas, enquanto um animal sempre será limitado a seu próprio crescimento.
O reinado dos Pets
Segundo a pesquisa do IBOPE de 2015 o valor gasto anualmente em torno dos animais seria de aproximadamente 16 bilhões de reais.
Mas com certeza hoje o número é muito mais alto, ja que está cada vez mais em alta além do comércio especializado, a nova modalidade, o conceito de estabelecimento “pet friendly” onde shoppings, cinemas, galerias de arte, padarias, cervejarias e os mais diversos comércios abrem suas portas para receber e também servir aos pets.
Existe inclusive em passeios de trem, vagões “pet friendly” onde tem um serviço de bordo com lanche especial para os bichinhos.
Também ja ouvimos casos de herança que é deixada para cachorro ou gato, casos onde há um total isolamento do convívio social para se dedicar exclusivamente ao “bebê Pet”, cachorrinhos e gatinhos tem salão especializado, spá, psicólogo, roupas de grife e jóias, uma verdadeira vida de rei.
Coisa de filme, diríamos há uns anos atrás, mas no caso, esta é a realidade atual. Sendo o Brasil o segundo maior mercado Pet do mundo, ultrapassando o Reino Unido e perdendo somente para os EUA.
Mas porque as pessoas preferem os animais?
São muitas as causas prováveis dessa escolha, no entanto a maioria delas de origem emocional.
As relações humanas mudaram muito, há uma superficialidade muito grande, uma falta de empatia, com o crescimento do uso da tecnologia as pessoas tendem a relacionar-se mais virtualmente do que pessoalmente, o que, segundo o sociólogo Zygmunt Bauman, seria um momento de frouxidão nas relações sociais.
Outros sociólogos definem as relações afetivas descartáveis como “amor líquido”, ou seja, muito vulneráveis, onde por meio de redes sociais a amizade, o amor e o respeito entre as pessoas são facilmente descartáveis.
Tudo isso acaba mudando também a relação das pessoas com o mundo ao seu redor. Uma relação afetiva tanto de amor quanto de amizade, demanda esforço das duas partes, ambos fazem concessões, ambos precisam “estar presentes” e “se entregar” e embora a maioria de nós goste muito de uma bela história de amor em um livro ou em um filme, sabemos que é um alto investimento de vida que precisa ser feito.
Acontece que muitas pessoas após uma decepção, um trauma ou até mesmo por conta da experiência observada do casamento dos pais, não estão mais dispostas a realizar esta entrega, a se abrir para que um outro ser humano compartilhe a vida consigo.
Outros, crescem com a firme ideia de investir em uma carreira promissora ao invés de uma família.
E assim optam pela solução mais simples, uma relação que demanda menos esforço, o amor sensível e incondicional de um bichinho de estimação que estará sempre ao seu lado e as vezes tem até uma certa independência, podendo ficar sozinho em casa enquanto a pessoa trabalha.
Para uma vida saudável, seja qual for a área, o mais necessário é o equilíbrio. O mesmo vale para a relação humano-pet, ela não pode ser usada como “muleta” ou “escudo” emocional.
Para a Psicóloga Maria Aparecida das Neves em casos onde as pessoas acabam por se isolar por causa de seus animais de estimação é preciso rever o que a relação com o animal significa para o dono.
O Amor excessivo por animais pode ser um reflexo da carência do dono.
Segundo os psicólogos Cloud e Townsend, em sua pesquisa sobre limites, o problema é que pessoas com conflitos internos de limites tendem a afastar-se dos relacionamentos íntimos e pensam ser um “retrocesso” ter de aprender novamente a relacionar-se com outros seres humanos.
Uma vez que, criar um relacionamento com as pessoas é um processo demorado, arriscado e doloroso e, mesmo depois de descobrir as pessoas certas (o que ja é bastante difícil), ainda é preciso admitir que, como seres relacionais que somos, precisamos um do outro.
Certamente pensando assim, é justificável a preferência pelos animais que, conforme mencionado anteriormente, não demandam de tanto esforço, eles simplesmente agregam sem esperar nada em troca, no entanto, por mais que aparente ser uma linda relação de afeto, como seres irracionais (por mais espertos e simpáticos que sejam), os pets não tem condição de suprir todas as demandas emocionais da mesma forma que outro ser humano.
Refletindo sobre tudo isso fica a dúvida, será que por causa do tempo em que vivemos, do desgaste das relações humanas, da superficialidade e das decepções vividas em relacionamentos tóxicos nós temos desistido uns dos outros?
Como tudo nessa vida, os relacionamentos tem um custo, mas será que não é melhor amar e perder do que nunca ter amado?
A verdade é que pode custar tempo e esforço, mas o que podemos viver e compartilhar com nossos semelhantes… isso definitivamente NÃO TEM PREÇO!